segunda-feira, 2 de março de 2015

LAST DANCE


Acordei com o gosto amargo do Bourbon ainda presente na saliva encorpada, tentando com apenas um dos olhos entreabertos, ver por entre as grossas cortinas, se o sol já começou a subir no horizonte. Não. Ainda era noite. As velas do candelabro ainda acesas, deram seus estalidos finais. O silêncio do frio e da neve gelaram meus ossos. Impossível levantar. A cabeça pesava mais que o planeta e o pequeno quarto girava em seu eixo. A cefaleia lancinante chegava a adormecer minhas têmporas. Virei de lado e encarei os lindos olhos verdes arregalados na minha direção. Observei que estavam um pouco embaçados, frios e vazios. Quem seria esta mulher deitada ao meu lado? Jovem de pele clara, percebi um filete de sangue ressecado sobre sua testa. A boca de lábios tenros que se mostravam azulados, estava aberta como que querendo soltar uma palavra. Com dificuldade, percebi seu corpo coberto por um lindo vestido de noite. Em seu pescoço longo, percebi marcas arroxeadas. Senti arder o meu rosto e ao tocá-lo encontrei com o tato de meus frios dedos, profundos arranhões que agora ardiam como brasa. Tentei me sentar na cama, sem entender o que aconteceu e vi garrafas quebradas pelo chão. Por entre os cacos, um pedaço de papel me chamou a atenção. Abaixei para apanhá-lo e caí sobre os cacos, desequilibrado pela tonteira. Mesmo sofrendo alguns cortes, me esforcei para levantar e tentar ler, ao mesmo tempo que tentei conferir se estava realmente no quarto de minha casa. Segurei numa das gavetas da cômoda e me apoiei para ficar de pé. A mão puxou o pano brocado que decorava a cômoda que fazendo o candelabro cair com sua cera quente sobre o meu rosto. O fogo se espalhou rápido por entre os cacos das garrafas de Bourbon que ainda ensopavam os tapetes aos pés da cama. Com a luz do fogo alto, pude ler o papel que agora se punha em chamas: Reisenweber’s Café – Columbus Circle, 58th Street and 8th Avenue, Manhattan. Antes que a fumaça me envolvesse totalmente até a morte, lembrei de Dora, a dançarina. Sim, era ela a quem tanto desejei. Por que matei-a? Antes da resposta, a morte me alcançou.

Nenhum comentário:

Postar um comentário