Jack colocou umas poucas peças de roupas na mochila
logo que acordou. Abriu a janela da sala e checou o tempo: estava perfeito!
Aquela era a época que ele mais gostava – final de abril. O calor do verão se
aproximava e o tempo, firme, seco e ensolarado trazia consigo a brisa fresca com
cheiro de mar. Foi até a cozinha, preparou alguns sanduíches, a garrafa de suco
de laranja, colocou na pequena bolsa térmica e pousou junto à mochila próximo
da porta que dava para a varanda. Voltou até a cozinha, bebeu seu café que
acabara de ficar pronto, comeu uns pedaços de queijo e um iogurte. Antes de
sair, verificou se tudo estava trancado, janelas fechadas, luzes apagadas,
cafeteira desligada enfim, o mesmo check list de quem sai de casa por um par de
dias. Passou pelo quarto e pode ver Selena que ainda dormia profundamente. Pode
ainda sentir o cheiro abafado de seu sono imerso no quarto escuro.
Pegou suas chaves e saiu fechando a porta sem fazer
barulho. Seu carro estava ainda coberto de orvalho cujas pequenas gotas
aquecidas pelos primeiros raios de sol se transformavam rapidamente em leves
brumas que envolviam o metal. Jack abriu o portão da garagem, ligou o carro com
seus bancos ainda frios e saiu pela estreita estrada de terra que levava até a
rodovia principal. Enquanto dirigia, escolheu tateando com cuidado, um CD de
rock progressivo do grupo Jethro Tull e aumentou o volume na música Too old to
rock n’roll too young to die. Aquela música como tantas outras o transportava
para um tempo anterior às suas escolhas que tanta dor estavam proporcionando. E
isso o deixava feliz a ponto de sentir seus olhos marejados por uma
incontrolável emoção provocada por uma forte saudade dele mesmo. Ao chegar no
cruzamento com a rodovia, parou o carro para tentar decidir qual caminho
seguir. Um levava a um balneário de lindas praias e águas transparentes que
muito lembravam a praia do bairro onde nascera e isso lhe trazia flashes de
suas lembranças brincando na fina e branca areia com baldinho e pazinhas. O
outro levava até as montanhas que traziam as melhores recordações de suas
férias de adolescente, seus passeios a cavalo, da lareira, do frio. Qualquer
uma das escolhas seria definitiva. Estava decidido a cometer a insana atitude
libertadora de largar tudo e tentar recomeçar um outro caminho que talvez
pudesse lhe trazer alegrias e realizações que não havia conquistado até então.
Para Jack, somente a coragem em fazer uma enorme ruptura poderia fazer com que
ele reencontrasse sua própria vida. Estranhamente se viu compelido a desligar o
carro. Ian Anderson cantava seus versos a altos brados e Jack desligou o CD
player. O silêncio tomou conta do cenário avermelhado pelos raios do sol que
insistia em nascer todos os dias. Olhou pelo espelho retrovisor como que
tentando ver sua vida e seu passado recente. O vidro embaçado não mentia sobre
suas impressões e se confundia com sua medíocre trajetória embaçada por suas
escolhas. Por um tempo difícil de determinar Jack ficou ali, parado, entre a
coragem de seguir um dos caminhos que antes proporcionaram tantos bons momentos
e a covardia de retornar.
Jack ligou o carro, respirou fundo e manobrou o carro de
volta à estrada de terra.
Mais um conto de tirar o fôlego, levando o leitor ao suspense e indecisão até o seu desfecho. Muito bom!
ResponderExcluirBravo! Levado ao clímax paulatinamente pela dúvida dilacerante que atravessa os desertos na solidão da escolha! Tira os pés do chão e nos faz flutuar nesse universo de possibilidades. Não podemos ter tudo! Toda escolha implica numa perda!
ResponderExcluirPerfeita observação. Muito bom quando atingimos o ponto que quero no leitor!
Excluir